“Orgulho: antônimo de vergonha. Conceito desenvolvido pelo movimento social LGBTQIAP+ para propagar a ideia de que a forma de ser de cada pessoa é uma dádiva que a aproxima das comunidades com características semelhantes às suas, e deve ser afirmada como diferença que não se altera, não deveria ser reprimida nem recriminada.” – Glossário do livro Homofobia: Identificar e Prevenir, de Jaqueline Gomes de Jesus
O tema da campanha #ProudAtWork desse ano quer imprimir uma estampa diferente da camiseta destacada na foto acima, que traduzida diz: “Em Junho nós vestimos as cores do Arco-Íris”. É preciso reconhecer e celebrar as marcas, empresas, culturas e espaços que asseguram os direitos e contribuem com os avanços da luta da comunidade LGBTQIAP+ durantes todos os dias do ano: somos #Out365! Existimos, resistimos e queremos usufruir do direito de sermos quem somos durante o ano inteiro: nosso orgulho não expira no dia 30 de Junho.
Sendo assim, queremos ir além desse lugar de reconhecimento e celebração, porque a campanha nasce também desse incômodo que sentimos ao nos deparar com uma enxurrada de cores usadas pelas marcas durante o mês do orgulho, mas que desbotam rapidamente conforme julho se aproxima. Afinal, sendo muito sincera, não é porque aquela empresa coloriu seu logo com as cores do arco-íris ou convidou um casal de lésbicas famosas para compor a sua publicidade de dia dos namorados ou deu destaque ao depoimento de um colaborador LGBTQIAP+ na sua página do LinkedIn que ela realmente está engajada em promover um ambiente acolhedor para a nossa comunidade ou que tem políticas intencionais de contratação de pessoas diversas ou que oferece lugar de fala e poder para os grupos minorizados. O compromisso tem que ser visível, mas não apenas no mês de Junho e muito menos limitado a um logo colorido!
Estatísticas para ir além do mês do Orgulho LGBTQIAP+
Apesar de não considerar necessário trazer números para provar a importância de se fazer a coisa certa, de ser ético e socialmente responsável sempre, não podemos menosprezar e invisibilizar algumas estatísticas que atravessam a história atual da comunidade LGBTQIAP+:
- De acordo com o relatório da Acontece Arte e Política LGBTI+ e Grupo Gay da Bahia divulgado este ano, em 2021 o Brasil registrou a ocorrência de 300 mortes violentas de pessoas LGBTQIPA+, 8% maior que no ano anterior.
- Há 13 anos no topo da lista, o Brasil continua sendo o país que mais mata pessoas trans no mundo e o número de assassinatos de mulheres trans e travestis é o maior desde 2008 — ano em que esses dados começaram a ser registrados.
- Em 69 países ainda é crime ser LGBTQIAP+ e em 7 deles, isso pode ser punido com pena de morte.
- Uma pesquisa realizada pelo LinkedIn em 2019 com profissionais LGBTQIAP+, apontou que 50% desses profissionais já assumiu sua orientação sexual no trabalho, mas dentre a outra metade, 22% nunca falaram sobre isso por medo de represálias e 35% dos entrevistados afirmaram já ter sofrido discriminação direta ou velada por parte de colegas e gestores.
Levantar a bandeira colorida apenas nos 30 dias de Junho não é suficiente
Ainda estamos distantes de uma realidade que proporciona dignidade e direitos iguais para pessoas LGBTQIAP+ — tanto no âmbito social quanto profissional — e levantar a bandeira colorida apenas nos 30 dias de Junho não são suficientes para uma empresa:
- Criar e disseminar as estratégias de contratação desses profissionais;
- Promover igualdade de oportunidades (desenvolvimento de carreira/promoções) e benefícios justos às pessoas LGBTQIAP+;
- Implementar e medir as métricas apropriadas para monitorar o avanço das políticas de diversidade;
- Investigar as denúncias LGBTfóbicas;
- Realizar treinamentos com a liderança e funcionários e colaborar com eventos de sensibilização e letramento;
- Estimular a criação dos grupos de afinidade e suportar o seu crescimento e estratégia;
- Garantir que as políticas de diversidade e inclusão também se desdobrem aos fornecedores e parceiros;
- Promover e apoiar projetos sociais em prol da comunidade LGBTQIAP+;
- Planejar e aprovar o orçamento que suporte todas essas iniciativas.
Eu poderia citar diversas outras linhas que deveriam compor a estratégia de Diversidade & Inclusão de uma empresa, mas tenho certeza que já ficou evidente que são necessários muito mais do que os 30 dias de orgulho em junho para garantir que o profissional LGBTQIAP+ possa se sentir seguro ao ser ele mesmo durante os outros 335 dias do ano.
O futuro do trabalho é cada dia mais colorido
A boa notícia é que, apesar dos grandes desafios que ainda temos pela frente como sociedade e mercado de trabalho, estamos evoluindo; vemos mais empresas engajadas com o tema, muitas consultorias especializadas sobre D&I e, este ano, chega ao Brasil uma pesquisa que certifica as melhores empresas para profissionais LGBTQIAP+ trabalharem! A análise é baseada em cinco critérios: políticas e documentações formais de não discriminação; governança em Diversidade e Inclusão e protagonismo das pessoas LGBTI+ empregadas; educação para a diversidade LGBTI+; compromissos públicos e monitoramento da Inclusão LGBT. Esta pesquisa já é aplicada desde 2002 nos Estados Unidos e foi adaptada à realidade do Brasil pelo Instituto Mais Diversidade.
É natural que o número de empresas avaliadas nesta primeira pesquisa ainda seja pequeno e quase inexpressivo frente ao imenso ecossistema de empresas brasileiras e que muitas outras que não foram analisadas também apresentam estratégias consistentes de diversidade & inclusão, mas sem dúvida essas 38 certificadas (das 100 avaliadas) podem e devem servir de inspiração e benchmarking para outras tantas que pretendem iniciar ou evoluir na caminhada por espaços com mais Diversidade, Equidade e Inclusão para pessoas LGBTQIAP+!
“Isso de querer
Ser exatamente aquilo
Que a gente é
Ainda vai
Nos levar além.”
– Paulo Leminski, Incenso fosse música.
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