Você já ouviu a frase que “todo governo é um esquema de pirâmide”? Ela foi dito por Bernie Madoff. Um nome muito falado e bastante conhecido (não de forma positiva) do mercado norte-americano.
Mas antes de entender o motivo pelo qual escolhi falar sobre isso, precisamos voltar algumas casas.
A sociedade humana é baseada na confiança. Vivemos em sociedade para a cooperação mútua e para uma melhora na vida de cada indivíduo em particular. Com a cooperação mútua, a vida fica mais fácil e todos saem ganhando.
Nenhuma sociedade sobrevive se existe uma suspeita coletiva em relação ao vizinho. Se não posso confiar em ninguém, então o perigo ronda em cada esquina e a colaboração em prol de um bem comum se torna uma impossibilidade.
Na economia e no mundo dos negócios, a confiança é um fator mais decisivo ainda, pois é nesse território que circula o ativo que nos garante a nossa própria subsistência: o dinheiro.
Porém, se por um lado a confiança é um fator tão determinante para a sobrevivência e manutenção da sociedade, por outro lado, ela também é um excelente instrumento que pode ser (e muitas vezes é) usado para o mal.
Ora, hipoteticamente, se queremos enganar uma pessoa, então a impressão mais forte que devemos passar para ela é a impressão de confiança. Um picareta explícito é um picareta fracassado, pois não engana ninguém.
E se algum dia houve alguém que soube usar da confiança exigida pela sociedade contra a própria sociedade, esse alguém foi Bernie Madoff.
O serial killer de Wall Street
No dia 4 de janeiro de 2023, a Netflix lançou o documentário Madoff: O Golpista de Wall Street, que é sobre Bernie Madoff, o planejador do maior esquema de pirâmide (esquema Ponzi) da história. Dirigido por Joe Berlinger, vencedor do Emmy, a obra tem como pano de fundo o esquema que durou décadas e enganou desde figurões da bolsa de Nova York, passando por astros do cinema e velhinhas ingênuas, e até mesmo bancos.
Hollywood em 2017 também já havia produzido a obra “The Wizard of Lies” (O Mago das Mentiras), com nada mais nada menos que Robert De Niro e Michelle Pfeifer protagonizando Bernie e Ruth Madoff.
De 1987 a 2008, Bernie Madoff, uma figura insuspeita do mundo dos negócios e presidente da NASDAQ, projetou e conduziu um esquema de fraude financeira que chegou ao valor de 64 bilhões de dólares. O foco do documentário da Netflix é mostrar que Madoff não agiu sozinho, e que para existir um esquema tão grande, é preciso haver cúmplices.
Madoff contou com a participação de vários colaboradores, pois a sua influência era grande em Wall Street. Frank DiPascali, financista e um dos tenentes de Madoff, ao se declarar culpado diante do juiz Richard Sullivan em 2011, disse:
“O fato claro e simples é que Bernie Madoff sabia, eu sabia e outros sabiam da imensa fraude. Tudo era mentira. Tudo era ficção”.
O documentário dividido em quatro partes tem por objetivo mostrar os bastidores do esquema, expondo grandes nomes de Wall Street que contribuíram com a fraude e outros que foram vítimas dela. O documentário cobre também vários relatos de familiares, investigadores, policiais e acionistas.
O mais impressionante de tudo é que não foram meses e nem alguns anos que toda essa farsa se perdurou. Foram quase duas décadas! Passando, inclusive, por auditorias e fiscalizações da SEC (CVM americana), literalmente enganando a todos — investidores, fundos de pensão, autoridades e até mesmo seus próprios familiares.
O caso brasileiro recente
Um caso recente de possível fraude que abalou o país e os noticiários econômicos foi o das Lojas Americanas, a gigante do varejo e a querida no coração dos brasileiros.
Com um rombo na casa dos bilhões em suas demonstrações financeiras e vários acionistas desesperados, o caso Americanas acendeu um alerta no mercado financeiro e teve repercussão até no Fórum Econômico Mundial.
Algumas das evidências que ligaram o alerta vermelho foi o aumento repentino de aluguéis de ações – quando um investidor aposta na queda de um ativo –, a negociação anormal de derivativos na véspera da divulgação da notícia e a venda de grande volume de ações por parte da diretoria.
As investigações continuam e os juristas estudam as punições cabíveis. Enquanto isso, o mercado e a mídia discutem o caso e tentam entender as consequências do episódio. Muitas pessoas prejudicadas, vários envolvidos e um valor astronômico em dinheiro, tudo isso perpetrado por uma das empresas mais confiáveis e tradicionais do país.
Esse é o paradoxo da confiança: todos nós precisamos dela e exigimos que ela exista. Porém, quanto maior ela for, maior será o potencial de prejuízo, financeiro ou não.
— Por Ernesto Schlesinger
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