Então, a ideia aqui é a seguinte: abrir os olhos para as lições de O Poderoso Chefão, em toda sua trilogia. sobre o que fazer e o que não fazer no negócios.
Hoje vou me dar o direito de entrar no mundo das polêmicas. Desafiá-los a enxergar com outros olhos semelhanças entre os opostos.
Vou mostrar para vocês que um filme às vezes pode te dar boas lições para a vida, por mais que o comportamento dos seus personagens seja moralmente reprovável.
Isso acontece porque boas obras de arte são como símbolos que nunca se esgotam, sobre os quais podemos sempre nos debruçar.
Então, a ideia aqui é a seguinte: a trilogia O Poderoso Chefão pode nos ensinar algumas lições úteis sobre negócios. Sobre o que fazer e o que não fazer.
Os seus personagens são quase todos moralmente reprováveis. A vida de cada um ali poderia ser condenada pelas razões mais variadas. Porém, a trama da história, o contexto em que se encontram e as decisões que tomam podem nos ensinar algo.
Duvida? Garanto para você que, se ler o texto até o final, vai querer rever o filme com outros olhos.
1 – Entenda o mercado
Deixando o debate restrito mais ao primeiro filme da série, em duas palavras, O Poderoso Chefão, inspirado no livro homônimo de Mario Puzzo, conta a história da família Corleone, comandada por Don Vito Corleone. O magnata do azeite é também o chefe de um negócio mafioso baseado na extorsão, contrabando, apostas e corrupção sindical, sendo um dos líderes mais proeminentes das famílias mafiosas de Nova York. Porém, a chegada do mercado de drogas vai imbricá-lo numa disputa que compõe o principal elemento do plot do filme.
Apesar dos métodos nada ortodoxos, uma das lições de O Poderoso Chefão que podemos observar é que Corleone entende a lógica de seu mercado criminoso. Ele sabe que a garantia do monopólio dessas atividades é vital à manutenção de seu poder, bem como sua expansão.
Podemos observar que a liderança de mercado e manutenção desse “status quo” são a fórmula que Victor encontrou para manter seu império no topo, saindo em vantagem sobre outras famílias.
2 – Comunicação e bom relacionamento
É claro que disso não podemos tirar lições literais. Afinal, nenhuma pessoa decente pode dispor dos mesmos instrumentos de persuasão e coerção que as famílias mafiosas. Porém, o que dizer da estratégia de comunicação com o público?
Como alguém que ainda acredita no contato pessoal e não se preocupa com publicidade, Corleone impôs seu produto legal (o azeite) como algo genuinamente siciliano, ou seja, apelou para o emocional de sua clientela como fórmula de venda;
Além disso, explorou o sentimento de pertencimento ao consumidor: comprando o Azeite Genco, você também fará parte da família Corleone.
Esse componente, da criação de lealdade entre stakeholders do negócio, é algo muito presente no filme. O chefe da família sabe como gerar vínculos emocionais de obrigação mútua entre as pessoas, e nem sempre precisa de violência para isso. A forma como presta favores para fornecedores, parceiros e clientes ensina muito sobre como gestos aparentemente gratuitos de gentileza podem fomentar a lealdade e a confiança.
3 – Controle seu negócio
Pode parecer repetitivo, mas ter o controle efetivo sobre o seu negócio é vital para o bom funcionamento da empresa. A forma como Corleone aplicou em sua “família” interessantes estratégias de controle pode ser vista na organização de funções e cargos distribuídos entre os membros.
Ao separar seus Caporegime (encarregados das ordens do padrinho), Clemenza e Tessio, para realizarem diferentes tarefas, o chefe criou duas linhas de operação dentro da empresa, bloqueando a possibilidade de uma conspiração conjunta e estabelecendo uma concorrência subjetiva com o intuito de melhorar o desempenho da organização.
Mas e o que Vito não entende? Primeiro, que nenhum negócio do mundo está garantido no seu território para sempre, por mais que um se procure proteger no corporativismo, na política ou mesmo na violência.
Explorando um mercado baseado principalmente na venda de proteção privada que nasce num contexto de desconfiança, algo que funciona, eminentemente, na base das relações pessoais, ele acha que pode combater outras famílias que decidem explorar mercados de alta demanda, competitividade, agressividade e lucratividade. Como consequência, Vito é baleado em um atentado e termina com a saúde bastante debilitada. Tudo muda nesse mundo e mesmo a sua organização teria que se reinventar para sobreviver. É uma lição que será aprendida rapidamente pelo herdeiro da família Corleone.
4 – Saiba se reinventar
Após a morte de Vito Corleone, seu filho Michael assume o império familiar e se torna o novo Don. Sabendo das inúmeras possibilidades em outras regiões do país, a família muda suas operações de Nova York para Las Vegas e Miami, onde iniciam negócios não explorados pelo antigo Don.
Ao se desfazer da empresa de azeite do pai, Michael entende que, em termos de business, o passado precisa ser superado para dar lugar a novos empreendimentos, e essa é mais uma das lições de O Poderoso Chefão que podemos trazer para a vida real. Nos filmes posteriores da saga, há lições igualmente importantes, mas sobre os riscos de adentrar em certas empreitadas, já que cada mercado do mundo criminoso é regido por uma economia política própria.
5 – Monte uma equipe de confiança
Ao assumir a organização, Michel Corleone reinventa a estrutura deixada por Victor e muda seus principais quadros de operação. Tessio é executado por trair a família e Clemenza se retira para formar sua própria família em Nova York. No lugar, Rosso é colocado como o braço direito do novo Don.
Confiança na sua equipe, portanto é essencial. Porém, só ela não basta: é preciso contar com pessoas habilidosas, com capacidade de encarar os desafios que sempre se renovam. Nesse caso, é interessante observar como o advogado da família, Tom Hagen, também precisou ser afastado do núcleo duro. Não por trair a lealdade do chefe, mas por faltar competência para encarar os novos tempos da família – que na trama lutava para estabelecer sua operação em outros estados. Saber realocar pessoas é uma habilidade que Michael demonstrou com sabedoria.
É possível pensar em outras lições de O Poderoso Chefão que vão do modo de olhar para alguém numa negociação ao tom correto para se usar em momentos em que é preciso aparentar senioridade, tranquilidade e autocontrole. Até mesmo as táticas utilizadas para fomentar desconfiança pelos mafiosos na sociedade podem nos ensinar muito sobre o tipo de prática que alguns concorrentes fazem e todos nós precisamos combater.
A obra O Poderoso Chefão tem várias pílulas de sabedoria, por mais que muitas atitudes das personagens sejam reprováveis moralmente e vão contra os princípios de uma boa governança empresarial. Como disse no início, a arte ensina o que se fazer e também o que não se fazer. Ambas as lições são igualmente válidas.
É preciso ter olhos para ver. E saber enxergar as flores que nascem no pântano.
– Ernesto Schlesinger
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