Precisamos dar suporte técnico e emocional aos profissionais de RH e à liderança das empresas, e não só fazer discursos vazios de incentivo.
Ainda sigo impactada pelo trabalho que venho desenvolvendo este semestre com a ONG Assistencial (citado no artigo do mês anterior). Nesta ONG falamos muito de coletivo que ampara mas também de cuidar de quem cuida da gente. Já parou para pensar que, por trás de toda boa empresa, existe um time de colaboradores que cuidam do tema Pessoas, Cultura, Clima, Engajamento, Inclusão e Saúde Mental para todos os demais colaboradores? Já parou para pensar que, enquanto este time de pessoas está na linha de frente do cuidado com o outro, poucas vezes tem alguém cuidando deles? Já parou para pensar quem está cuidando das pessoas que cuidam da gente?
E, sob a luz desse tema, recebi também estes dias de uma querida colega de trabalho um artigo da Exame sobre o excessivo burnout que vem ocorrendo com os colaboradores da área de Recursos Humanos. O artigo fala especificamente do time de RH, mas a verdade é que ele se aplica também a todas as pessoas na posição de liderança da empresa.
Os profissionais de RH e a liderança precisam de preparo para serem a linha de frente nos cuidados organizacionais
É incrível como as pessoas dentro das empresas assumem que o time de RH e as pessoas na liderança da empresa são automotivadas e auto cuidadas, como se essas pessoas estivessem sempre plenas e preparadas para cuidar de todos, ainda que ninguém esteja cuidando delas. O time de RH e o time de liderança são colaboradores tão qual você, e sofrem das mesmas inseguranças, medos, preocupações e sobrecarga que todos nós sofremos. Sofre e ainda tem que ter capacidade para lidar com o sofrimento de todos os demais. Se você nunca se deu conta disso, comece a se dar conta agora.
É preciso cuidar de quem cuida da gente. Profissionais cuidadores de outros, como o time de RH, os líderes, os assistentes sociais, médicos, enfermeiros, psicólogos, entre tantos outros, são gente que também precisa de cuidado. Não é porque uma pessoa está numa posição de cuidar de outros, que essa pessoa está isenta de ser atravessada pelos problemas e pelos sofrimentos inerentes ao ser humano. Os cuidadores são gente humana, gente que adoece, que tem mau-humor, que tem medos, que tem exaustão e que chega, muitas vezes, ao burnout.
Gente que cuida do burnout dos outros, também sofre seus próprios burnout.
Como cuidar dos cuidadores organizacionais?
Escrevo este texto visando fazer diferentes convites a diferentes públicos:
- Às empresas: precisamos pensar em como podemos preparar os profissionais de RH e pessoas na liderança, para que estejam mais aptos, técnica e emocionalmente, para serem essa linha de frente nos cuidados organizacionais. Precisamos suportar estruturalmente essas pessoas, e não só fazer discursos vazios de incentivo.
- Aos profissionais de RH: precisamos nos cuidar em primeiro lugar. Herói morto não vence a guerra, portanto não adianta carregarmos nas costas o peso do sofrimento organizacional e não buscarmos formas de nos preparar, capacitar e, especialmente, nos cuidar para termos estrutura emocional para este desafio.
- Aos líderes: independente da área em que atuamos, também somos cuidadores organizacionais e também precisamos nos preparar, capacitar e nos cuidar. Não é missão só do RH saber lidar com gente, lidar com engajamento, lidar com preocupações, lidar com burnout. E não é apenas missão do RH sustentar o sofrimento organizacional. Nós, líderes, também precisamos saber lidar com tudo isso e, para isso, precisamos estar bem física, mental e emocionalmente.
- Aos demais colaboradores: precisamos exercitar a empatia, olhar ao redor e perceber que aquelas pessoas de quem tanto reclamamos por não estarem fazendo um bom trabalho de apoio organizacional, também são gente, também são humanos, também estão lutando suas próprias batalhas e, sim, muitas vezes sem apoio, sem preparo e sem recurso nenhum. Nós também podemos fazer algo para cuidar dessas pessoas de quem esperamos tanto cuidado.
Ouse ser uma organização que cuida de quem cuida da gente
Fazer o cuidado organizacional demanda técnica, ferramentas, recursos e muita, muuuuita, estrutura física, mental e emocional. Não podemos negligenciar esses aspectos.
Se eu não me capacitar tecnicamente, eu não estarei apta para exercer um cuidado organizacional de qualidade, no máximo irei agir na base do bom senso, o que é muito perigoso e pode acabar piorando a situação toda. Se a empresa não me der ferramentas e recursos adequados, eu não conseguirei exercer um cuidado organizacional digno, no máximo acabarei virando um muro de lamentações para minimizar os incêndios dos colaboradores.
Se a empresa e eu, juntos, não investirmos em cuidar da minha estrutura física, mental e emocional, eu não conseguirei ser uma profissional com sanidade o suficiente para exercer um cuidado organizacional lúcido, no máximo vou ficar me afundando cada vez mais na tentativa de sustentar o sofrimento organizacional às custas da minha própria saúde mental já em frangalhos.
Talvez você termine de ler este texto e ache tudo um grande exagero, um grande drama, um grande mimimi. Pois não acredite em mim, ouse conversar com as pessoas que estão na linha de frente do cuidado organizacional. Ouse escutar verdadeiramente as histórias dessas pessoas. Ouse descobrir a que custo elas estão fazendo o que fazem. Ouse cuidar de quem cuida da gente.
Quem sabe assim a gente começa a criar um ciclo virtuoso de organizações que se cuidam, e não mais organizações que “delargam” essa missão na mão de poucos, ao custo dessas pessoas,
Gracias,
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